Quinto Fichamento ....
Aspectos genéticos e sociais da sexualidade em pessoas com síndrome de Down.
Lília MA Moreira e Fábio AF Gusmão
Laboratório de Genética Humana e Citogenética, Instituto de Biologia, Universidade Federal da Bahia (UFBA). Salvador, BA, Brasil.
Rev Bras Psiquiatr 2002;24(2):94-9
“A síndrome de Down (SD) é um distúrbio genético, descrito
inicialmente pelo médico inglês John Langdon Down em 1866.1
É condicionada pela presença de um cromossomo 21 adicional
nas células de seu portador2 e ocorre como trissomia livre
em cerca de 95% dos casos. Nesse distúrbio podem ser também
observadas outras formas de trissomia que podem ocorrer
em mosaicismo, com células normais, e outras com trissomia
21 em 1% a 2% dos portadores da síndrome, além de translocações
geralmente entre os cromossomos 14 e 21 em cerca de
3% a 4% dos casos.3 Na maioria das vezes, o distúrbio
cromossômico deve-se à mutação de novo, sem chances maiores
de recorrência na família.” (p.95)
“O fato de nascerem crianças com trissomia 21 de mães jovens,
assim como a comprovação de erros na divisão celular de
origem paterna, mostram que a idade avançada não é o único
fator interveniente. Não obstante, Castilla et al4 ressaltam a importância
da idade materna avançada na origem da SD e observam
que, se as gravidezes fossem antecipadas em alguns anos,
30% dos casos da síndrome seriam evitados sem a utilização de
nenhuma tecnologia complexa e dispendiosa.” (p.95)
“A SD é caracterizada por um grau variável de atraso no desenvolvimento
mental e motor e está associada a sinais como
hipotonia muscular (90,9%), prega palmar transversa única
(59,0%), prega única no quinto dedo (18,1%), sulco entre o
halux e o segundo artelho (77,2%), excesso de pele no pescoço
(82%), fenda palpebral oblíqua (100%), face achatada (86,3%),
de acordo com estudo de revisão.5 Os valores em parênteses
referem-se à freqüência dos sinais entre os portadores da
síndrome. Para a manifestação dos sinais clínicos críticos na
SD, é necessário que ocorra a trissomia da banda cromossômica
21q22, correspondente a 1/3 do cromossomo 21” (p.95)
“Estudos recentes com modelos animais realizados por Smith
et al9 revelam que material gênico adicional na região 21q22.2
implica déficit neurológico. Moreira et al10 observam que, entre
os produtos gênicos conhecidos nessa região cromossômica,
a APP (proteína precursora amilóide) foi decisivamente relacionada
à SD, estando associada ao déficit na adesão celular, na
neurotoxidade e no crescimento celular, com implicações na
formação do sistema nervoso central. O seqüenciamento gênico
do cromossomo 2111 revelou pouco conteúdo informacional,
com apenas 225 genes (127 conhecidos, 98 preditivos e 19
pseudogenes), o que pode explicar a maior sobrevida e adaptação
de portadores.” (p.95)
“Pueschel & Scola22 investigaram as percepções parentais
das interações sociais, incluindo o interesse no sexo oposto,
a função sexual e a educação sexual de jovens com SD. Concluíram
que mais da metade do grupo estudado mostrava interesse
no sexo oposto; poucos indivíduos tiveram educação
sexual, e, entre os jovens, a masturbação era praticada por
40% dos homens e por 22% das mulheres. Os autores também
observaram que a metade dos pais de jovens com SD acreditava
que os filhos deveriam ser esterilizados ou ter alguma
forma de controle de natalidade, caso tivessem possibilidade
de reprodução.” (p.96)
“Elkins et al26 relatam história de casal com SD e descrevem o
relacionamento como sendo bem-sucedido em termos da privacidade
e da autonomia do casal. Nos casos apresentados por
Brown,25 os casais tinham vida independente, com emprego ou
recebendo pensão do governo, o que pode ter facilitado a manutenção
dos vínculos. No Brasil, embora sendo comuns casos
de namoros, não há conhecimento de união entre pessoas
com a síndrome.” (p.96)
“De acordo com diversos estudos, Glat26 observa que, mesmo
estudando em classes regulares, a maioria das crianças e dos
jovens com deficiências continua segregada socialmente em
suas comunidades, e, muitas vezes, seus relacionamentos pessoais
são limitados à família, aos profissionais e a outras pessoas
portadoras da mesma deficiência.” (p.96)
“No desenvolvimento da pessoa com síndrome de Down, a
puberdade e a maturação sexual ocorrem de forma comparável
às de pessoas da população geral, em termos de idade e regularidade
das menstruações, como revelado no estudo de
Goldstein27 realizado com 15 adolescentes, probandas portadoras
da SD e controles sem essa síndrome. O trabalho refere idade média da menarca em 13,6 anos para as probandas e em13,5 para controles, duração de sangramento de 5,5 dias nas
probandas e de 5,4 no grupo-controle e duração média do ciclo
de 28,3 dias para as probandas em relação ao período de 28,6
dias para os controles. Os problemas ginecológicos mais comuns
nas mulheres com SD são os cuidados na higiene menstrual
e os sintomas pré-menstruais” (p.96/97)
“Bovicelli et al30 também referem que, do ponto de vista
genético, mulheres com trissomia 21 podem produzir gametas
euplóides, 23,X e aneuplóides 24,X+21, resultando em
metade da descendência normal e metade trissômica. Entretanto,
a partir dos casos descritos por esses autores, a proporção
de descendência com SD é de 30%, havendo, portanto,
um risco empírico mais baixo de recorrência do distúrbio.
A maior chance de procriação em mulheres do que em homens
SD pode estar relacionada não apenas a eventuais disfunções
sexuais mais freqüentes no sexo masculino, mas também
a diferenças no desenvolvimento emocional e no comportamento
sexual.”(p.98)